domingo, 28 de novembro de 2010

"O Conto Da Vida"



O conto que conto
encanta e desencanta
qualquer cântico de dor.

Pois o amor com que faço
um esplendor nesta poesia,
vai moer toda a dor do dia-a-dia
pra encantar este conto
em que me encontro.



“Nanopoesia” (2005-2007, inédito)

"Marisco No Deserto"



De certo, arrisco
qual marisco
em areias fumegantes
sem trincheiras.

Não há boas maneiras
nem pessoas de leva-e-traz.

Há muito mais:
tua boca cheia de beijos quentes
feito areia onde o marisco se enrosca
só pra fazer chover saliva.




“Nanopoesia” (2005-2007, inédito)

"Microscopia"




Sanados dejetos
na grande extinção,
não vai ter cristão
que salve su’alma.

É só transição
este mundo tão vago
quanto uma simples goiaba.

É o que nos contam
os micróbios gelados
adormecidos por céus de chão.




“Nanopoesia” (2005-2007, inédito)

"Doce Heresia"



Da ternura que te faço,
em cada sonho que componho,
surge um sentimento nobre,
tão pecado, tão de cobre,
que só vem pra atazanar.

Mas, silente frente ao sonho
me enfadonho de poesia
pra nutrir a tua imagem
com desejos constrangidos
que adoçam esta heresia...



“Nanopoesia” (2005-2007, inédito)

"Paradoxal"




Da tormenta, faço o sol,
Do mamute, um rouxinol,
Imaginação infinda.

Do açúcar, faço sal
Do que é raso, um abissal,
Imaginação e tal...


Deste espaço, faço tempo
imaginando o bom momento
em que volto ao teu abraço
e tudo fica certo, então...



“Nanopoesia” (2005-2007, inédito)

"Flavinha"



Fostes cedo, mas ficastes
na memória de quem está,
na saudade deste tempo...

Tanto mais, sobra pra nós
os momentos em que a vida
é porta-retrato de lembranças.

Fostes jovem, mas estás
no coração de quem lembra
com o carinho que não jaz...



“Nanopoesia” (2005-2007, inédito)

"Sombrio"




Luz voraz que vem cegar-me
no prazer da claridade
clandestinamente...

Luz incandescente
opaca, opala, fluorescente,
abraça-me...

Traz claridade ao infortúnio
com intuito de ser luz
e dar vida à minha sombra...



“Nanopoesia” (2005-2007, inédito)

"A Beleza Da Negra"




A savana em seu corpo
incendeia-se: a vida recomeça.
Paisagens vegetais
que estimulam meus olhos
tanto quanto uma mulher.

Florestas que enfrentam desertos,
de certo que fico absorto.

A beleza que agiganta o continente
não esconde o abandono
de uma gente desnudada...



“Nanopoesia” (2005-2007, inédito)

"O Grito"




Vou dar graças ao Senhor
por ter nascido
e por ter, até o momento, sobrevivido
a sentimentos que emudecem
o meu grito...

Vou dar graças ao Senhor
e assim repito,
só pra não ficar sem graça
frente à vida que se passa
e eu nem ligo...



“Nanopoesia” (2005-2007, inédito)


"Leitura"




Há de ser um dia livro
Tudo aquilo que vivi
Por prazer ou por vaidade.


Há de ser uma saudade
Que por instintivo orgulho
Vou dizer que não senti.


Hei de ler este meu livro
Quando o peso destes anos
Não couber em qualquer página...



“Nanopoesia” (2005-2007, inédito)

"Instinto"




Queima e aquece qual lareira,
enlouquece sem juízo,
apedreja meu bom senso
e me julga um tanto herege.

Faz arder hormônios jovens
resguardados entre rugas
que se despojam em sorrisos.

Mais que isso: és boa cama,
criadora de má-fama,
porém boa em meu instinto...



“Nanopoesia” (2005-2007, inédito)

"Puto Com a Puta"



Ei-la: Leila
sem eira nem beira,
na sobremaneira de não ter juízo.

Fico puto com tudo isso:
é só prejuízo dar crédito à Leila
sem eira nem beira.

Só encontro barreiras,
trincheiras e asneiras
vindas da Leila que não tem juízo:
enquanto eu nada tenho com isso
- nem Leila...



“Nanopoesia” (2005-2007, inédito)

"Coquetel Molotov"




Isso é pura putaria,
coisa suja, quase asneira.
De arroubo se estou de bobeira,
me toma sem aviso,
quase de brincadeira...

E eu fico numa de sério,
fingindo só tédio
num puro tesão...

Explosão: baixo os olhos
e fico silente, olhando entre coxas,
quase inocente...


“Nanopoesia” (2005-2007, inédito)

"Segredos Submersos"




No fundo do poço
há qualquer coisa:
talvez uma rocha,
uma velha raiz...

Quem sabe a esperança
de uma meretriz
fingindo-se Iara
para me encantar...

No fundo do poço
há peças perdidas
de vidas passadas e adormecidas
na gélida água
que insiste em brotar.

Quiçá haja um lar
para sonhos perdidos
ao longo do caminho
entre o fundo e o lumiar...

No fundo do poço
há mais uma coisa:
um troço de amor
pra ficar escondido
sem qualquer ajuda,
sem nenhum aviso
para, secretamente,
feliz, se afogar...



“Nanopoesia” (2005-2007, inédito)

"Gabrielado"




O meu filho é quem mais amo,
muito mais que a mim mesmo,
muito menos que eu queria...

O meu filho é minh’alegria
muito mais que uma folia,
bom enredo e carnaval.

O meu filho é parte minha
mas, no todo, sou mais ele:
deu a luz à minha vida.



                            Para meu filho, Gabriel Taranto.




“Nanopoesia” (2005-2007, inédito)

"Complexo De Rousseau"



O que te estraga é o plenilúnio,
que transcende em teu sorriso
e que deslumbro em teu olhar.

Não há tempo para sermos sempre os mesmos
sem nos permitir corromper
por desencantos da vida.

O que te repara é o mesmo sorriso,
e é somente por ele e por tudo isso
que me sinto capaz de te deslumbrar...



“Nanopoesia” (2005-2007, inédito)

"A Gota D'água"





A gota d’água, a gota poesia
A gota da minha poesia.
A gota mulher, a gota homem
A gota mistério, a gota que esgota
A gota que enche, a gota d’água.

A gota d’água
De um ribeirão, de uma torneira
De um balde, cheia de vida
Cheia de criação, cheia de oxigênio
Cheia de balde, cheia de torneira
Cheia de ribeirão.

A gota mistério, a gota histérica
A gota calada, sua real plenitude
Sua ideologia de ser apenas a parte
Menor ainda maior
Que toda e qualquer nuvem.
Sua vida de rumo incerto, seu anonimato
De ser apenas uma gota.

A gota d’água que cabe num copo
Não cabe no tempo.
Que cai sem destino, que cai calada
Mas cai, dá um salto, um salto para a vida
Vida de um balde, vida em uma torneira
Vida em um ribeirão...

A gota d’água
É o maior universo
Da criação...



Do livro “Ovo À Milanesa”, 1994.

"Pano de Prato"




Depressão em forma de orgasmo
sarcasmo, desgraça da vida
sofrida, seca, trabalha e pensa
não pensa:
é só um pano de prato.

A mão que lhe afaga é suave
ou quase, a mão da senhora calejada
amada, por um homem que não lhe toca
marasmo:
é só um pano de prato.

A alça que lhe prende é de madeira
besteira, sua vida ali está presa
surpresa, ele vai ao chão e não é amparado
magoado:
é só um pano de prato.

A criança que lhe pisa é herança
esperança, á água limpeza, a dor
pregador:
é só um pano de prato.

O gato que lhe solta pelos o despreza
reza, ao deus dos panos um amparo
raro, um olhar que aprecie sua beleza
o fato:
é só um pano de prato.

E o tempo há de vir e apodrecer-lhe
e ver-lhe: jogado um monturo de um muro
apuro: será apenas mais um maltrato
mas é grato:
é seu destino de pano de prato.



Do livro “Ovo À Milanesa”, 1994.

"Brasil Lido"




Super-homem, Wolverine
Homem-Aranha ou Mulher-Invisível.

Imaginação plástica
Em acrílicas emoções.
Gente que se liga nessa gente
Faz a utopia ser verdade
Pois a luta entre o bem e o mal
Está mais presente nas páginas do dia-a-dia.

Analfabeto não sabe das coisas.
Analfabeto não lê gibi.




Do livro “Ovo À Milanesa”, 1994.

"Moda"




A tua moda não intui a minha moda.
E o teu durex não colou o que quebrei.
São coisas da oratória
nessa vida que é uma oração.

Um imenso quartel de bobagens
e bagagens, silenciosas como gatos.
À espera do próximo avião
eu me encontro, rumo ao que é silêncio.
Subjetivamente e abstrativamente,
vou nas metáforas desta moda:
tudo sob controle.

Controle do modo
com o qual você me seduziu.
Talvez uma puta que pariu um anjo
que beijava a boca do Diabo à sua moda
e ao seu querer:
nada mais que Brasil.



Do livro “Ovo À Milanesa”, 1994.

"A Mais Solitária Canção..."



Eu

mente.
É mentira:
há coisas ao meu redor.
Objetos mentirosos
solidão.

Eu
comigo
pronomes.
E mais:
os nomes e coisas com as quais convivo.
Corpos independentes
solidão.

Eu
tu
útero.
Não havia
a solidão de todos os dias.
Corpos
ligados
solidão.

Eu mundo
participação.
E faço-me
Parte desse mundo e no meu mundo
vastidão
vazia
solidão.




Do livro “Ovo À Milanesa”, 1994.

"Angústia"





A mágoa água as águas
desse pranto que não choro
por fora.

Por dentro há desejo
sobejo e seco
que não cabe em si
por não caber em mim.

No peito sangrado
fatigado de tanta juventude
de um viver assim tão pouco
tão tosco que se expande a ti.

Mas as palavras estão ausentes
presente só a mudez
que se fez na boca
aguada, magoada
de tanto pranto que jamais choramos
por fora – nada.



Do livro “Ovo À Milanesa”, 1994.

"O Cântico Dos Jesuítas"





E veio a maré cheia
Trazendo a ameaça pelo Atlântico.
Não as espadas ou as chibatas,
A ameaça: o desejo insaciável do ensino,
Não do que Jesus disse,
Mas das suas orações que a Igreja mudou.

E veio o índio ainda puro e vivaz
Trazendo ouro e outros pedaços da ambição
E os genocidas do oceano sanaram a dívida
Trazendo a fome, a peste, a febre e a morte.
Em nome de Jesus eles trouxeram
Com as orações que Ele ensinou.

E veio o Jesuíta com sua flauta doce
Salgar o que era puro em missa pós-caduquismo
E veio ensinar ao índio o Pai-Nosso
Trazendo o veneno do esquecimento.
Não do que disse Jesus,
Mas pelo que ele nos entregou.

E o índio perdeu sua origem,
Sua cultura e sua livre persona.
E cantou e morreu e mais nada sobrou:
Índio rezando frente a um crucifixo,
Não no qual Jesus foi pendurado,
Mas naquele em que o índio se pendurou...



Do livro “Ovo À Milanesa”, 1994.

"Ave-Maria"





Para os policiais e marginais do dia-a-dia:
Ave-Maria!
Para os muambeiros do morro e da coxia:
Ave-Maria!
Para os parceiros da droga e da vida vazia:
Ave-Maria!
Para cristãos e evangélicos com sua Bíblia:
Ave-Maria!

Para os eleitos que cantam sua hipocrisia:
Ave-Maria!
Para os poetas que veneram as antologias:
Ave-Maria!
Para os monarquistas que almejam outras especiarias:
Ave-Maria!
Para os maconheiros que padecem na aptialia:
Ave-Maria!

Para os negros que trazem na raça a primazia:
Ave-Maria!
Para a dona-de-casa que desconhece a alegria:
Ave-Maria!
Para o trabalhador que sonha obter alforria:
Ave-Maria!
Para a luz no fim do túnel que há tempos não reluzia:
Ave-Maria!

Para o Brasil enfim,
Que surge e morre
Com o nascer e o pôr-do-sol, todos os dias:
Ave-Maria!





Do livro “Ovo À Milanesa”, 1994.

"Prostituta De Botequim"




Seu nome é Joaquim:
prostituta de botequim.
Sua roupa é de cetim:
prostituta de botequim.
Sua bolsa não tem nada afim:
prostituta de botequim.
Sua tatuagem não é de nanquim:
prostituta de botequim.
Seus olhos não brilham assim:
prostituta de botequim.
Seus sonhos, pra lá de Pequim:
prostituta de botequim.
Seu amor não parte de mim:
prostituta de botequim.
Seu tormento é desconhecer o “sim”:
prostituta de botequim.

Nas rimas de seu nome sem rimas
Não vejo conto ou verso feliz
Vejo um bar, espelunca, botequim,
Onde o social, que sempre lhe renega,
Assiste impassível à agonia de seu fim...




Do livro “Ovo À Milanesa”, 1994.

"Corpo Santo"





Dou pra ti do meu pedaço
E te ofereço o meu perigo
Assumo o risco de outra conta
Se me afronta o preconceito
De querer-te no meu peito
Pra viver-te um pouco mais...

Vou ao cais da insanidade
De quem vive a ter desejos
Onde o alvo é encoberto
Pelo certo que imperfeito
Me impede de ser teu.
Sou ateu para as más línguas
Que se calem ante a proposta
Que me fazes com um olhar
Vou ao mar, me afogo em prantos
Onde o cais da tempestade
É não ter-te a me esperar.

Dou pra ti meu corpo inteiro
Onde o meio é tua gula
De perder-se em corpo santo.
Lanço um cântico que escutas
E desfrutas da esperança
De me ter inteiro e teu
Pra fazer da pouca idade
Esse cais da insanidade
Que é querer-te, enfim, mulher...



Do livro “Ovo À Milanesa”, 1994.

"O Que Ainda Não Fiz..."



Vou te pegar
roubar teu destino
drogar-te com olhos
e levar-te ao infinito:
Estou aflito,
sequiosos em afagar-te, incansável,
insaciável de tanto amor.
vou fazer isso e muito mais...

Vou te deitar
perder-me em tua boca
saborear tua língua
rastejar em tua pele
arrancar teu sutiã com os dentes
e deslizar, lentamente,
pelo perfume do teu cheio.
Acarinhar teus seios
invadir teu corpo
com meu corpo que é puro pecado
rolar contigo nas águas do nosso leito
e, como efeito, invadir a noite
com nosso calor que é pura poesia
e maior a heresia
de não conhecermos limites:
ninguém nos assiste
e assim vou fazer isso e muito mais...

E quando o dia clarear
e a luz do sol abrir nossos, olhos,
vou redescobrir-me sozinho
sem te ter no meu caminho
que far-se-á pura solidão.
Tudo será sonho, nada o que se diz
Tudo que, contigo ainda não fiz
e n’outro sonho pensarei estar fazendo...



Do livro "Ovo À Milanesa", 1994

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Sou maluco, chamam-me de bicho
e me convidam para festas.
Oferecem-me umas vitaminas
feitas com comigo-ninguém-pode,
espada-de-São-Jorge, leite com manga
e eu bebo, que sou maluco.

Chamam-me de bicho
e muito mal me visto,
com calças e sapatos envelhecidos,
pares diferentes:
no meio dessa gente, sou bicho.

Arrumo minhas malas
e vou para lugar nenhum:
insôn
ia letárgica,
realidade mágica,
intrépido truque:
e há quem me amaluque.

Deixo o cabelo crescer,
permito nascer a barba imberbe,
morro em meu viver.
Correndo, caminho,
acompanhadamente sozinho,
criando velhos neologismos,
encontrando quem me chame de bicho.

Sou maluco: que assim me denominam.
Sou bicho: que assim me fazem.
Mas nada sou sem o toque ardente do teu beijo...


Do livro “Ovo À Milanesa”, 1994.

"Detalhes Tão Pequenos De Nós Dois..."





E eu, melancólico,
A relembrar, bucólico
O nosso alcoólico jeito de amar
E de nos dar de nossos corpos
De nos embriagarmos com tantos detalhes
Que, de tão pequenos, pouco se fazem...

A saliva nas bocas secas,
O toque nas tuas melenas,
O sabor do beijo e das línguas
Sim, a vida ensina
A nossa sina feito cruz que não carregamos
Pois arrastamos
Pelos vales e precipícios do desatino
Destino daqueles
Que fazem pouco dos detalhes.

O meu jeito de te olhar pedindo mais,
O teu jeito de pedir quando é demais
Todo o pequeno universo que apraz
Os amantes do presente sem porvir
E há de vir uma saudade tão mordaz
Dos detalhes que, de tão pequenos,
Parecem infinitesimais.

E eu, melancólico
Num momento monótono
Numa solidão alcoolizada
E mais nada, só detalhes
Os quais relembro, sem querer,
Quase que por instinto
Detalhes que, de tão pequenos,
Hoje parecem tão distantes
E de tão grandes, infinitos...




Do livro “Ovo À Milanesa”, 1994.

"Seu Beijo"



Padecer sem fim é ficar sem o seu beijo.
O sabor do seu corpo
Tão louco e tão morno
No céu de minha boca.
Sua língua mais louca
A procurar ofegante
Um desejo infante
De ser tão mulher
Pra saber como é...

Falta que sinto de ti
Do teu jeito tão matreiro
De sorrir e me benzer
Com sua saliva em minha boca
Medindo forçar pra conter o prazer.
Sua pele debutante
É lembrança restante
Passado que não volta,
Infelizmente não volta...

Hoje tenho de amargar
A distância a nos fustigar
Impiedosa e indiferente.
Não há mais o sabor do seu beijo
Nem o odor do seu desejo
Ou mesmo meus lábios mornos.
Há solidão, vazio que não finda,
Há quem minta, diga injúrias de você,
Não há como te ver 

pra te deter entre meus braços,
Não há mais seus abraços,
Não há mais seu beijo,
Não existe mais nada...



Do livro “Ovo À Milanesa”, 1994.

"Macaíba"



Chega mais, diz que me ama
Deixe em minha boca
O gosto dessa chama
Que é teu beijo...
Prova do meu desejo
E deguste cada pedaço.
Somos a saída do mar de sargaços
Que são nossas vidas:
Somos a única saída.

O abraço que te espera
É feito de aço
Composto de amassos
Sorrisos na despedida.
Somos a saída desse obscuro pecado
Que é amar pra ser amado,
Viver para ser degolado
Por teus abraços
Razão de minha vida:
Somos a única saída.

Chega mais, beija minha boca
Tão rouca e tão louca
À espera do sabor do mel
Na tua saliva – ainda temos saída
Pra fugir desse mundo perverso
E viver no reverso da paixão
Que é esse amor, fuga da solidão
Que é te abraçar e me esmagar no teu carinho.
Chega mais, não me deixe sozinho
Que eu não deixo a tua vida
Por ser ela nossa única saída
Pra qualquer coisa melhor...




Do livro “Ovo À Milanesa”, 1994.

"Passos No Infinito"





Deixo-a só
e sou o infinito em que caminhas,
onde adivinhas o princípio do que sou...
E vou mais suave em pensamentos
e no meu intento de não mais deixar-te.
Estar nos teus passos
e fazer dos teus suspiros a razão...
E se adivinhas o princípio aqui presente,
torna-te onipotente
frente às provas mais cabais
em que tu vais, caminhando entre estrelas
e por não vê-las tens mais brilho
e, de mais bela, mais cristais...

Deixo-a só
e sou o passado às tuas costas
o qual tu gostas de recordar,
a eterna lembrança de um sorriso.
Por tudo isso, vou contigo
por todas as calçadas em que passas.
E se fracassas, sou teu pranto
que, no entanto, é todo um mar
onde sou peixe e sou marisco.
E não me arrisco a desbravar
os limites da areia quente
na qual me faço o teu caminhar...

Deixo-a só
e sou o horizonte à tua espera,
o infinito em que caminhas
e onde tinhas a vontade voar.
E serei par de tuas asas flutuantes
e, de andante, sou a certeza a apaziguar
de que teus passos rumam a esse infinito:
infinito de teus passos, teu sorriso
onde não mais tornarei a te deixar...


Dezembro de 1992




Do livro “Ovo À Milanesa”, 1994.

"Dublê De Corpo"




Sim, não mais seguirei estradas tortas
nem vou bebericar agrotóxicos da ilusão
ou mesmo quebrantar o coração:
no peito, veneno na surdina funesta.
Houve uma fresta e por ela tu passaste,
mas mergulhaste comigo, sem ter fim,
nos mais profundos olhares desditosos.

Sim, não mais far-me-ei tua intenção
que não satisfaço teus gostos.
No meu rosto, a herança triste
de quem inexiste para ti
e se faz infortúnio que importuna
na fortuna da tua beleza:
mas não serei arestas do teu passado.

E repensado o porvir se não sou do teu agrado,
se para ti a estética é estática, feita de mídia,
não me faço de bom grado, e sim logrado:
far-me-ei dublê de corpo às tuas vaidades.
E quanto à perfeição grega que desejas,
hei de possuí-la de forma sobeja:
músculos, carne, pelos e cabelos cacheados...

Sim, este ator que está em cena
ganha somente a tua pena,
tua comiseração e frigidez:
o amor fica para o dublê...




Do livro “Ovo À Milanesa”, 1994.

"Alentos"




Dorme...
Dorme teu sono apaziguado.
Sorria em teu sonho de rosa
Com o coração delicado,
Jamais magoado - pétala branda,
Doce odor que tudo canta
E encanta...

Dorme...
Dorme teu sono de bruma,
Sorria feito brisa
E dê mais graça à minha noite insone.
Descansa, que não somem os alentos
Que a cada momento te oferto,
Te aperto...

Dorme...
Dorme feito criança,
Que te beijo o desnudado rosto de nuvem
E vou ao mundo dos teus sonhos tranqüilos.
Repousa que o dia já chega
E se quando acordares me encontrares dormindo,
Descansa comigo em meu sono de menino...


Do livro “Ovo À Milanesa”, 1994.

"Eu Te Amo"





Eu te amo porque te amo.
Assim disse o poeta de Itabira.
Mas será que te amo só porque te amo?
Será que não há mais razões para te amar?

Sim, te amo porque te amo,
Porque te sinto amor...
Porque desejo tocar teu corpo
E sentir teu cheiro misturar-se ao meu...
Sentir-te totalmente
E, na mente, te ter no peito
Quem sabe para sempre
Ou talvez por uma só noite...

Eu te amo porque quero amar-te
Em todas as noites de todos os mundos.
Em nossos mundos, amar-te
E para sempre amar-te
Viver-te cada momento,
Cada lamento e cada pranto:
Para sempre amar-te...

Eu te amo porque te amo.
E que não seja simples amor e um por quê,
E que não seja eterno enquanto venha a durar,
Mas que seja infinito eternamente...



Do livro “Ovo À Milanesa”, 1994.

"O Que Sinto Por Ti..."





Te amo
simples e errado
de coração desbotado,
pranto farpado...
Um espinho que fere
quando toco a pele
do teu corpo:

entorpece toda a dor que entristece.
O sorriso que te oferto, 

por certo, não chega perto
de tanto que sinto por ti...

Te amo,
simples e solitário.
Feito vida no aquário,
estou preso, peito indefeso
diante da tua beleza que me escraviza,
no amor do Sol que brilha
só para chamar-te a atenção
- mas não em vão,
por tanto que sinto por ti...

Te amo
de brilho nos olhos,
de lábios sequiosos
por sentir o teu gosto.
E no teu rosto, aurora meiga
que me pede: deixa-me...
Mas não te deixo,
mas não te esqueço,
mas não me queixo
porque te amo...




Do livro “Ovo À Milanesa”, 1994.

"Neste Mundo"





Neste mundo eu não vivo:
Eu tento sobreviver.
Neste mundo eu não estudo:
Eu tenho que aprender.

Neste mundo não posso rir:
Eu tenho de sorrir.
Neste mundo não perco nada,
Não se pode desistir.

Neste mundo eu sou humano
Pois penso para existir.
Neste mundo não perco nada:
Eu tenho que refletir.

Neste mundo eu não caminho:
Eu tenho uma meta.
Neste mundo eu não erro
Pois tenho uma trilha certa.

Neste mundo eu não durmo:
Eu tenho que descansar.
Neste mundo eu não amo:
Eu tenho que amar.

Neste mundo eu não compreendo,
Eu não posso compreender
Qual é o sentido da vida
Que todos têm que viver...



(04 de agosto de 1989)


Do livro “Ovo À Milanesa”, 1994.

"Proposta"




Há quem espere uma colheita
Bem mais próspera somente
Se a proposta funcionar...
Há quem espere destes frutos
Desatinos mais maduros
Ao que está pra se acertar.

Sejam benditos os frutos
Elevando uma proposta
Indecente por si só.
Ante a mudança de estado
Nos estágios bissextais
Que transmudam a elegância
Na ganância desse ópio
Em que o vício os leva e traz.

Quem semeia, aguarda ansioso
A colheita que se espera
E que pode ou não chegar
Dependendo da adubagem.

Há quem espere essa viagem
Rumo a outra dimensão
Que não esta já tão gasta
Frente à vasta escuridão
Que o futuro nos concede
Se tais frutos não vingarem...



Do livro “Ovo À Milanesa”, 1994.

"Professores"




O menino se matou
Por não saber que não existe suicídio
Para o espírito que é eterno.
Hoje preso está
Às lágrimas da perda da matéria
Abandonada a todo o custo...

As pinturas são a prova da loucura
Morre nos livros o que um dia aconteceu
Professores é que fazem os momentos eternos
Grandes homens e mulheres da realeza do saber...

Explica-me que o amor é essencial.
Explica-me que dor é vida pra quem sabe viver.
Explica-me que a paz é mais importante que a guerra
Ensina-me o que eu preciso aprender...

O menino se matou
Por não ter sido compreendido
Ele voltou pr’o verdadeiro mundo.
Mas voltou da maneira errada
E vai ficar a dor de alguém
Que já se foi...



17 de maio de 1990


Do livro “Ovo À Milanesa”, 1994.